O papel da mente nas lesões do esporte

De três a cinco milhões de adultos e crianças se lesionem a cada ano nos ambientes esportivos, de exercício e em passeios recreativos. O curioso é que pessoas com altos níveis de estresse de vida têm mais lesões relacionadas ao esporte e ao exercício. Portanto, esse é um tema que pode interessar não apenas atletas de alto rendimento, mas a população em geral.

 

Fatores físicos como desequilíbrios musculares, colisões, treinamento excessivo e fadiga física são as principais causas de lesões nos exercícios físicos. Ou seja, são as causas primárias de lesões esportivas. Mas os Fatores Psicológicos podem desempenhar seu papel e contribuir para elas em função das características de personalidade – que estão entre os primeiros fatores psicológicos associados a lesões esportivas e que se referem ao:

– Autoconceito (autoestima e autoconfiança)
– Introversão e extroversão
– Inflexibilidade de personalidade

Níveis de estresse também podem ser fontes de lesões, como mudança de vida importante, perda de ente querido, mudança para uma cidade diferente, casamento ou mudança na situação financeira. Além disso, estressores menores e aborrecimentos cotidianos, como dirigir nas grandes cidades, também podem contribuir para elevar o nervosismo e preocupação.

No ambiente esportivo profissional, onde a competição e as exigências são enormes, as evidências sugerem que atletas com altos níveis de estresse tendem a sofrer mais lesões.

As reações psicológicas às lesões esportivas são consideradas respostas emocionais ou reações que os atletas costumam ter, que podem chegar a uma forma semelhante às pessoas que enfrentam experiências de morte. Ou seja, atletas frequentemente reagem passando por um processo de cinco estágios:

1. Negação
2. Raiva
3. Negociação
4. Depressão
5. Aceitação e Reorganização

Os atletas não necessariamente seguem um padrão ou ordem predeterminada em relação a esses cinco estágios. Portanto, pode-se esperar que atletas lesionados exibam três categorias de respostas em geral:

1. Pensamentos sobre a lesão – sobre a dor, consciência da extensão da lesão, perguntas de como aconteceu e a tomada de consciência sobre as consequências.
2. Revolução emocional e comportamento reativo – momento em que o atleta pode se tornar agitado, experimentar emoções oscilantes, sentir-se esgotado, isolar-se, sentir medo, incerteza, descrença, negação ou autocomiseração.
3. Perspectiva positiva e controle – quando aceita a lesão, lida com ela demonstrando atitude positiva, de otimismo e inicia esforços para recuperação.

Uma pessoa pode passar por esse processo em um ou dois dias e outras podem levar semanas ou meses.

Outras reações psicológicas à lesão:

1. Perda de identidade – uma parte de si mesmo se perde, afetando o que ele pensa dele mesmo ou autoconceito.
2. Medo e ansiedade – sobre a recuperação, novas lesões, a substituição permanente na equipe.
3. Falta de confiança – o que diminui a motivação.
4. Diminuição de desempenho – devido à baixa de confiança e ao tempo de treino perdido, podem sofrer declínio de desempenho e, com isso, muitos atletas têm dificuldade em diminuir suas expectativas após uma lesão e podem esperar voltar ao nível de desempenho do período anterior à lesão.

A depressão é uma das indicações de má adaptação à lesão, porque o atleta demonstra a sensação de que não pode fazer nada para mudar esse quadro, e se coloca na condição de vítima. Esse estado mental/emocional é desfavorável porque impacta na perspectiva negativa de futuro, o que compromete ainda mais sua capacidade de enfrentar o problema, procurar alternativas para a solução e impacta também fortemente em sua atitude mental. O trabalho com pessoas com depressão é feito especialmente identificando e desafiando crenças e convicções que o colocam nesse estado mental/emocional, portanto, é de extrema importância uma orientação psicológica para evitar as emoções negativas típicas, tais como: descrença, frustração, vulnerabilidade (ansiedade) e, claro, a depressão.

Outros sinais de má adaptação às lesões e que merecem atenção são:

– Sentimento de raiva e confusão
– Obsessão por quando poderá voltar ao esporte
– Negação – a lesão não é grande coisa
– Retornar muito cedo e se lecionar de novo
– Orgulho exagerado das etapas de realização
– Insistência em queixas físicas menores
– Culpa por desapontar equipe e familiares
– Afastamento de pessoas significativas
– Mudanças repentinas no humor
– Pensar que a recuperação não vai acontecer (quando existe essa possibilidade)

Atletas com recuperação rápida demonstram que utilizam mais estratégias de estabelecimento de metas, diálogos internos (com eles mesmos) mais positivos à partir de incentivos e, em menor grau, visualização da cura e recuperação. Isso sugere que fatores psicológicos (PSAI – Pensar, Sentir, Agir e Interagir), desempenham um papel importante na recuperação de lesões e explica porque atletas que lidam melhor com suas lesões se diferenciam de outros menos bem-sucedidos. Essa diferença se dá em função dos seguintes aspectos:

– Cumprem melhor os programas de reabilitação e tratamento;
– Demonstram atitude mais positiva em relação à situação de lesão e a vida em geral;
– São movidos por metas e objetivos e, com isso, são mais dedicados e determinados.

Em geral, a indicação do trabalho psicológico corresponde a um programa interdisciplinar e deve estar previsto durante todo o processo de recuperação, nos mais variados casos. Esse procedimento contribuirá em muito para a prevenção e recuperação das frustrações (que é uma emoção característica de quem não esta conseguindo atingir suas expectativas e que se manifesta sob forma de revolta – raiva ou, decepção – tristeza/depressão).

Posso citar um caso prático que vivenciei em 2001, quando fui contratada pelo Clube Atlético-MG, sob o comando do Técnico Levir Culpi.

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Ao avaliar psicologicamente a equipe durante a pré-temporada, conheci um atleta que tinha se submetido a uma cirurgia e estava no processo de recuperação. Naquela oportunidade, as dificuldades financeiras com a família e as dúvidas sobre sua total recuperação e a volta aos gramados o colocava num estado de vulnerabilidade emocional – ora esperançoso, ora com os medos típicos da incerteza.

Com o método Coaching (processo de mudança), traçamos um plano de trabalho baseado em Objetivos, Estratégias e Ações – passo a passo. O interessante é que nessa oportunidade o atleta já projetava uma carreira internacional e a meta também de chegar à Seleção Brasileira.

Ele conseguiu visualizar essa possibilidade com tanta convicção que conversando com a comissão técnica comentei que ele apresentava indicadores psicológicos de um atleta realizador (perfil vencedor).

Justifico essa projeção porque identifiquei nele alguns dos ingredientes que demonstram um atleta com recursos psicológicos diferenciados, com AUTODOMÍNIO – capacidade de produzir resultados (enfrentar desafios, resolver problemas, atitude mental positiva e a postura criativa que difere da postura de vitima).

O resultado, todos nós conhecemos. Esse atleta é o Gilberto Silva e por anos foi um vencedor na Seleção Brasileira.

Em resumo, além da definição de um projeto: Objetivo, Estratégia e Ações, as habilidades psicológicas mais importantes para se aprender no processo de reabilitação são:

– Estabelecimento de metas (tarefas especificas que o tirem da condição atual, rumo a desejada)
– Diálogo interno positivo (convicçõesdecapacidade de realização)
– Visualização do futuro e imagens fortalecedoras.
– Treinamento das emoções básicas – MARTA (medo, alegria, raiva, tristeza, amor).
– Aprendizado sobre a concentração e controle emocional, que requer habilidades de foco no que se quer, e não no problema, técnicas de relaxamento, técnicas de solução de problemas (porque as adversidades vão continuar se apresentando) e aprender a utilizar os “aplicativos” (pensamento, intuição, memoria, percepção, imaginação) que dispomos nessa máquina maravilhosa chamada cérebro, para que possamos jogar a favor e não contra nós mesmos.

Como afirma Timothy Gallwey, ex tenista e atual Coach de Tênis:

“O adversário que mais interfere no rendimento independente da área de atuação é o adversário interior, estado interno cujo oponente se encontra na forma de pensar e não no adversário externo. É ele quem produz distrações através de diálogos internos e julgamentos, capazes de provocar desconcentração, desmotivação e descontrole emocional até mesmo nos grandes jogadores”.